Neuma Silveira defende que a fisioterapia comece o quanto antes
A fisioterapeuta Tereza Neuma Aguiar Silveira de Freitas, ou simplesmente dra. Neuma, com 29 anos de experiência na profissão e muitos cursos ao longo de sua jornada, não tem dúvidas em afirmar que a “fisioterapia exercida com amor tem um efeito bem melhor”. Formada pela Universidade de Fortaleza (Unifor), dra. Neuma explica que não tem uma especialização formal, mas que sua “especialização é a vida, quebrando a cabeça e estudando”. Ela se diz uma profissional “eternamente apaixonada” pela minha profissão. “Meu marido diz que o grande concorrente dele se chama fisioterapia”. Dra. Neuma concedeu uma entrevista a Sem Barreiras onde ela falou da importância da fisioterapia para pessoas com deficiência e deu dicas aos interessados. Confiram:
Sem Barreiras: Dra. Neuma, tenho Osteogêneses Imperfeita (OI) e só descobri a fisioterapia aos 39 anos de idade. O que eu perdi? Como poderia estar minha vida em termos de qualidade? O que ainda pode ser feito?
Neuma Silveira: De antemão, quero dizer a você que nunca é tarde para começar. O ruim da história é nunca tentar. Você perdeu no sentido de que a melhor fisioterapia seria a profiláctica. Começaria tudo antes de qualquer sequela. Você recondicionaria a parte cardio-pulmonar para que no futuro não houvesse este tipo de compressão que você tem nesta escoliose, que está comprimindo o seu coração, seu pulmão e outras mais. Com certeza, suas AVD’s (Atividades de Vida Diária) seriam melhores porque determinadas sequelas hoje você não teria, como bloqueios articulares. As dores, com certeza, seriam menores. A sua expansão cardio-pulmonar, com certeza, seria melhor. Mas, nunca é tarde. Ruim é nunca acordar para determinadas falhas do passado. Não existe culpado. Tudo foi o tempo. Àquela época, tudo era muito difícil. Ninguém ouvia falar em Osteogênese em Fortaleza. Agora, nós fazemos o quê? Agora, nós vamos bloquear o patológico e estimular o fisiológico, fazer um recondicionamento geral na tua vida. Começando da parte postural. Como procurar um profissional em Fortaleza para atender pessoas carentes. Existem em Fortaleza alguns locais que atendem ao povo carente, como essas faculdades que colocam os alunos para aprender. A FIC (Faculdades Integradas do Ceará), a Unifor, a UFC (Universidade Federal do Ceará) têm; são poucos, mas têm. Você entra num cadastro para esperar ser chamado. São poucos, mas têm. Na parte de OI, infelizmente, são poucos profissionais que se dispõem a tratar. Não sei qual é a causa. Não sei se é medo de enfrentar a patologia que a gente sabe dos riscos, fratura e tudo o mais. Aqui ainda é muito restrito o conhecimento (NOTA DO BLOG: estou, atualmente, fazendo fisioterapia com a doutora Camila Napoleão – leia mais aqui).
SB: Por que uma pessoa com deficiência deve fazer fisioterapia?
NS: É exatamente para melhorar suas incapacidades que, por ventura, irão aparecer. Você vai estimular seu corpo como um todo para evitar sequelar.
SB: Para as crianças que já nascem com deficiência, é recomendado que a fisioterapia comece ainda quando são bebês ou existe uma idade mínima para que o corpo reaja melhor?
NS: O ideal é assim que for detectada qualquer deficiência você agir prematuramente. O paciente nasceu, você já começa. Claro que vai tudo gradativo, em cima do quadro que ele apresentar. Então, a fisioterapia quanto mais precoce, o resultado melhor. Isso é sem dúvida. Por exemplo, paciente que nasce com retardo motor, existe a Estimulação Precoce. O paciente nasceu, já começa. Gradativo, de acordo com a capacidade de cada um. Vou agir em cima daquela deficiência que estou vendo para evitar aumentar mais ainda. Muitas vezes, a gente recupera, rapidinho, dependendo do grau e do tipo de lesão.
SB: Quais os cuidados necessários que o profissional precisa ter durante os exercícios?
NS: Mil cuidados. E volto para a clínica que o paciente apresentar. Por exemplo, uma osteogênese, Osteogenesis Imperfecta. Eu vou visar uns exercícios gradativos para que o paciente aumente a capacidade cárdio-respiratória. Não posso tratar só para fortalecer os braços, pernas e tronco, sem ver a parte cardíaca. Senão, eu vou dar uma força exagerada, uma sobrecarga no coração e, de repente, o paciente pode até apresentar uma parada cardíaca durante o tratamento porque ele não tem aquela capacidade de exercer aquelas atividades. Então, é tudo gradativo.
SB: É importante o trabalho integrado com os profissionais? Quais e por quê?
NS: É de fundamental importância o trabalho com ética profissional, associando a uma equipe multidisciplinar para você saber até onde você deve ir. Pedir sempre opinião do colega quando chegar seu limite. Eu só sei aquilo ali. Então, o profissional capacitado em outro órgão, em outra área, vai me dar uns dados para saber até onde devo ir. É muito importante. O resultado é outro. Os médicos, os profissionais, enfim, infelizmente, não valorizam a fisioterapia. Modéstia à parte, a fisioterapia evita muita, muita desgraça em determinadas pessoas. A fisioterapia tem que ser indicada exatamente quando o paciente está bem, para que ele não venha a sofrer futuras doenças até irreversíveis, algum quadro irreversível. O paciente deitou. O paciente deitado muito tempo, pode ter certeza que não é bom. Começa a atrofiar, começa a dar problemas cárdio-pulmonares, retorno venoso etc. O paciente deitou, ele já deve fazer uma fisioterapia preventiva. Deitar que eu falo no caso de se prostar. Exemplo, um idoso com fratura de colo de fêmur. Geralmente, este paciente adquire uma pneumonia e aí vai. A fisioterapia tem que ver o paciente como um todo. Não são todos os profissionais que pensam assim, este é meu ponto de vista. Se eu vou tratar uma perna, o paciente está acamado, eu vou dar uma geral no paciente. Não vou tratar a fratura, mas o paciente como um todo. E a parte vital, os órgãos vitais, no caso, coração e pulmões, têm que estar em primeiríssimo lugar. Sem a perna, você vive, mas sem o coração e os pulmões legais, você não vive. Você tem que dar uma ênfase ao paciente como um todo, ao ser humano como um todo. Não é o dedo, não é o pé, não é a perna, é o todo. Gosto muito de visar o paciente por esse lado.
SB: A senhora pode citar algum caso em que tenha trabalhado e que o resultado ilustre a importância da profissão?
NS: Alguns casos. Teve um caso que me marcou muito. O paciente chegou para mim, indicado por um traumo-ortopedista, com uma fisioterapia indevida para ele. Eu insisti, relutei e o paciente se zangou comigo porque queria que eu fizesse exatamente o que o médico tinha passado. Eu disse para ele que procurasse outro profissional porque aquele tratamento eu não iria fazer. Expliquei por que não iria fazer. Acabei sem fazer. Ele foi embora chateado. Voltou ao médico, que ligou para mim super desaforado e eu fui explicar, fisiologicamente, porque eu não iria fazer aquilo que ele estava passando. Até porque quem traça o plano da fisioterapia não é o médico, é o fisioterapeuta, isso é por lei. Ele tava mandando eu fazer uma conduta que iria deixar o paciente totalmente deficiente. Ele reconheceu, o paciente voltou para mim e hoje nós somos muito amigos. Eu fiz exatamente aquilo que achei que deveria ter feito. Eu ia sequelar o paciente se eu tivesse seguido a conduta que o médico tinha mandado. Eu acho que cada profissional tem que agir na sua área e ser humilde para, quando não souber, reconhecer que essa não é a sua parte e deixar o outro tratar.
SB: Gostaria que a senhora falasse da importância da fisioterapia em relação a determinadas patologias, como Síndrome de Down, paralisia cerebral, paraplegia, tetraplegia, raquitismo, Osteogênese.
NS: Vou traçar a fisioterapia, o plano de tratamento, de acordo com o quadro clínico que o paciente apresentar no momento. O que eu vou trabalhar em cima dessas patologias? Em cima das hipotonias musculares (diminuição do tônus muscular, da força), que seria a flacidez, em cima da falta de coordenação. Em cima das hipotrofias, vou fazer o quê? Vou tentar fortalecer os músculos porque hipotrofia é exatamente a fraqueza muscular. Vou tentar deixar hipertrofiado, vou tentar melhorar a força muscular desse paciente. Vou ver as deformidades ósseas, articulares. Vou ver os bloqueios antálgicos, que seriam aqueles movimentos que, quando mexem, causam dor. Vou ver se o paciente tem problemas de dispnéia (cansaço respiratório). Se, neste paciente, existem parestesia (dormenças), a fisioterapia vai estimular e melhorar. Vou ver a parte de incordenação motora, procurar melhorar neste nível. Então, a clínica é soberana, não é todo paciente com Síndrome de Down que tem características iguais. Cada caso é um caso, não existe receita de bolo na Fisioterapia. Paralisia cerebral: passo a, b e c, tratamento x. Não é assim. Vou tratar em cima da clínica que o paciente apresentar no momento.
SB: A senhora acredita que existe algum tipo de preconceito contra a fisioterapia? Falta de crença na sua eficácia?
NS: Já existiu e existe muito. Já melhorou muito, é verdade, mas tem muito o que melhorar. Mas, o próprio fisioterapeuta deixa muito a desejar. Por exemplo, eu já soube de vários casos, não estou dizendo que sou referência, pelo amor de Deus, vivo engatinhando na minha vida profissional, tenho uma fome enorme do saber, mas eu não sei de nada, todo dia eu tento aprender um pouquinho. Mas, o que eu já soube de colegas de perder cirurgias de determinados médicos. Eles têm até razão, têm receio de indicar fisioterapia, não vou negar. Porque o fisioterapeuta não se impõe em nível de interesse para fazer seu trabalho honesto. Age por agir.
SB: Como a senhora qualifica o ensino universitário de Fisioterapia na cidade?
NS: Isso está um perigo. Porque em cada esquina hoje tem um curso de fisioterapia. Como a gente sabe, existe uma má qualidade muito grande. É uma coisa pra ser vigiada que eu acho que estão levando na chacota. Há muitos cursos incompletos, não só na área da Fisioterapia como em todas as áreas. Cursos muito baratos que, com certeza, pagam pouco aos profissionais, que não são bem capacitados. Acho que deveriam rever, o próprio MEC (Ministério da Educação).
SB: Qual a importância dos pais e familiares no trabalho fisioterápico de crianças e adolescentes?
NS: É muito importante porque o profissional em si passa muito pouco tempo com o paciente em comparação à família. Em uma família presente, que incentive e estimule, o resultado é outro. Porque a fisioterapia ensina e pratica, mas tem o resto do dia todo ocioso. Então, a família, estando em cima, dando estímulo, bloqueando os índices posturais, ajuda demais. A família é um incentivo. Até em nível de interação na sociedade. A família ajuda muito.
4 Comentários
Dra Neuma Silveira , competente fisioterapeuta , pacientes diversas patologias! Realmente vive se dedica aos pacientes melhorando qualidade de Vidas. Excelente entrevista !
Obrigado, Célia. Grande beijo.
Excelente notícia
Dra. Neuma é uma excelente profissional
Concordo com sua exposição. Resido hoje em Rib. Pires-SP . A realidade aqui é pior. É necessário que as instituições que nos representam, as quais anualmente somos Obrigados a contribuir, para exercer nossa profissão, tb exerça seu Dever. É necessário, fiscalização eficaze e continua. Dra.. Neuma, parabéns, seu amor a profissão é contagiante. Todos que te conhecem partilham desta experiência extraordinária. Que DEUS a abençoe sempre e mais
Obrigado, Glaú, pela sua mensagem. Repassarei à dra Neuma. Grande abraço.