Construindo a autonomia das pessoas com SD
Vou começar com um questionamento para os prezados leitores que me dão a honra e prazer de conhecer as minhas reflexões; a pergunta é: quantas pessoas com Síndrome de Down vocês conhecem? Uma? Duas ou três? Dezenas? “Qual é a autonomia que você acha possível ser obtida na vida adulta dessas pessoas?”
Esta pergunta é fundamental para estabelecer a base da autonomia dessas pessoas. Talvez os pais de adultos com mais de 30 ou 40 anos de idade já estejam vivendo o dilema de imaginar como será a vida deles quando os pais não estiverem vivos. Este assunto eu vou abordar em outra coluna, quando entrar no assunto sobre envelhecimento das pessoas com SD.
O indivíduo que nasceu com a síndrome há mais de 30 anos cresceu em um cenário extremamente discriminatório, onde parte da sociedade considerava uma vergonha ter um filho “mongolóide”, para usar um termo muito comum naquela época. Os tempos mudaram, felizmente. Naquele cenário, falar em autonomia parecia um sonho impossível, um delírio de pais que viviam fora da realidade. Pois bem, essa realidade mudou. E mudou pra melhor.
Nas últimas colunas venho falando sobre trabalho e empreendedorismo de indivíduos com SD, foram dezenas de exemplos, e ainda tem mais; olha só essa empresa que só contrata pessoas com deficiência e é um tremendo sucesso de público. Clique aqui.
São muitos os exemplos, uma pesquisa na internet pode dar um bom embasamento para os interessados em conhecer mais as possibilidades dos indivíduos com SD. Mas o primeiro passo é a crença das pessoas, é a pergunta que fiz no começo: qual autonomia é possível?
Os pais mais recentes já encontraram um mundo mais receptivo, onde não só houve um certo investimento em educação inclusiva como também surgiram iniciativas que buscavam a capacitação e a profissionalização de pessoas com deficiência intelectual. Não só a SD, mas também autistas (TEA) e indivíduos com todo o tipo de deficiências.
Assim, fica mais fácil imaginar uma autonomia maior para um indivíduo que é capaz de trabalhar ou de ter o seu próprio negócio. Quando você tem contato com essa realidade, começa a acreditar que aquela pessoa que você conhece também tem potencial e possibilidades as mais diversas. Só precisa que as pessoas acreditem em seus talentos. Sim, eles têm muitos talentos! O mais difícil é a sociedade investir seriamente nessa direção.
Então vou falar de autonomia para os adultos, obviamente. Vou falar de iniciativas para geração de renda e para a realização das atividades da vida diária, basicamente a questão de moradia (tema de uma próxima coluna). Inicialmente, quem investe em projetos de geração de renda para pessoas com deficiência no Ceará?
O Estado, cumprindo sua função social, tem realizado diversas atividades nesse sentido. Um bom exemplo é o Laboratório de Inclusão da Secretaria de Trabalho e Desenvolvimento Social – STDS, que dá apoio técnico e científico às políticas públicas de inclusão social no Estado do Ceará. A STDS também desenvolve muitas parcerias com instituições da sociedade civil, que assumem o papel de executar as políticas públicas de inclusão laboral.
A APAE de Fortaleza e o Recanto Psicopedagógico são bons exemplos de instituições que participam de seleções públicas e realizam projetos de capacitação profissional para indivíduos com deficiência intelectual, voltados para culinária, produção artesanal e atividades que possam lhes gerar renda ou uma vaga de emprego.
Resultado dessas ações: muitos jovens estão empregados e outros produzem cadernetas, bijuterias, naninhas (almofadas de tecido), bolsas, etc. Além disso, o Grupo de familiares do Recanto produz artesanato utilizando técnicas de bordado a mão, crochê e patchwork em capas para almofada, panos de prato, caminhos de mesa, bolsas e objetos semelhantes.
Todos esses objetos são comercializados com o objetivo de gerar renda para as pessoas com deficiência e para seus familiares. Mas nós ainda temos dois problemas graves para resolver, antes que a autonomia que estamos falando seja possível. O primeiro é a resistência das empresas em contratar pessoas com SD; o segundo é a falta de local para a comercialização.
Construir a autonomia desejada passa a ter então dois obstáculos fundamentais: o primeiro é sensibilizar nossos empresários para que contratem pessoas com a trissomia, tema que foi abordado em colunas anteriores. O segundo desafio é encontrar canais de comercialização para os produtos e serviços ofertados pelas pessoas com SD. E este será exatamente o tema de nossa próxima coluna.
Que tal um local onde diversas pessoas com a síndrome e também com outras deficiências possam se encontrar para trabalhar juntos, vender seus produtos, apresentar suas artes e potenciais e até mesmo se divertir e mostrar seus talentos? O Laboratório de Inclusão já está apoiando uma iniciativa nesse sentido, peço ao leitor que pense no assunto para nos ajudar a construir esse sonho.
Aguardo vocês daqui a quinze dias para apresentar este projeto. Encaminhe suas críticas e sugestões para o site do Sem Barreiras, ajude a construir um MUNDO PARA TODOS!
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