Site ajuda pessoas trans a ter emprego
Transexuais e travestis sempre enfrentaram preconceito e falta de oportunidades no mercado de trabalho. Até 90% dessas pessoas sobrevivem na prostituição, segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Mas uma plataforma online criada em 2013 por um grupo de ativistas transexuais, a Transempregos, veio para tentar mudar essa realidade. O site afirma ser com o maior banco de currículos e vagas para pessoas trans do país.
De acordo com dados da própria plataforma, são 22.537 profissionais cadastrados. De janeiro de 2020 a janeiro deste ano, houve um crescimento de 315% no número de usuários.
A grande maioria é formada por homens trans (47,20%), seguidos por mulheres trans (29%), travestis (6,80%) e pessoas não-binárias, aquelas que não se reconhecem nem como homem nem como mulher (11,10%).
Na plataforma, é possível criar um cadastro, montar um currículo e acessar as vagas disponíveis de forma gratuita.
Hoje, a Transempregos conta com 800 empresas parceiras que anunciam suas vagas por lá. São organizações de diferentes portes e segmentos, desde agências de propaganda, supermercados e escritórios de advocacia até empresas do ramo farmacêutico, de educação, moda e tecnologia.
Das 1.419 vagas abertas exclusivamente para pessoas trans na plataforma em 2020, 799 foram preenchidas. Este ano, já foram 92 contratados graças à Transempregos em janeiro e 47, em fevereiro.
A desenvolvedora de software Amélia Guerreiro, 25, de Bicas (MG), começou seu processo de transição hormonal em julho de 2019 e passou a usar a Transempregos em setembro do ano passado. A plataforma a fez se sentir confiante e confortável para participar de um processo seletivo.
“Antes, eu vivia com medo de ser reprimida e não conseguir um emprego por ser trans, como se estivesse fazendo algo errado simplesmente por ser eu mesma”, diz.
O medo, no entanto, ficou no passado. Em março deste ano, Amélia foi contratada para uma vaga oferecida na plataforma e está muito feliz no novo emprego. “Eles me acolheram, me respeitam, dão abertura se eu quiser falar algo e estou aprendendo muitas coisas”.
Para as pessoas trans que estão desanimadas na busca por uma oportunidade, ela aconselha a não desistirem e faz propaganda da plataforma. “Com certeza, vão achar alguma vaga que se encaixam naquilo que procuram, assim como eu achei a minha”, opina.
Profissional de sistemas da informação, o paulista Ian P., 28 anos, ainda sonha com a contratação. Ele se reconheceu como um homem trans em 2016 e começou seu processo de transição em 2017. Nesse mesmo ano, passou a acessar a plataforma em busca de empresas abertas para a contratação de pessoas trans. Para Ian, se candidatar às vagas anunciadas pelo site traz um conforto de saber que não será julgado por ser transexual.
“Existe um preconceito implícito que acaba excluindo as pessoas trans das oportunidades. Então, estar nessa plataforma é uma garantia de que não serei discriminado por conta disso, mas avaliado pela minha capacidade”, diz. Em busca de recolocação, seu objetivo é conquistar um cargo de coordenação ou gestão na área de tecnologia.
Ian acredita que as empresas ultimamente até estão mais propensas a terem profissionais trans em equipes técnicas, como suporte ou funções operacionais, mas não enxerga a mesma abertura quando se trata de cargos de liderança. “Estou em uma empresa no mesmo cargo há oito anos. Apesar de minhas responsabilidades terem crescido, nunca recebi uma promoção”, afirma.
Por isso, ele está sempre de olho nas oportunidades que surgem no site. “Vejo que muita gente está conseguindo graças à plataforma. Isso anima e dá uma motivação a mais”, diz.
Isabella De Avila, 36, obteve emprego no Transempregos. Natural do Rio Grande do Sul e vivendo atualmente em São Paulo, ela começou o seu processo de transição aos 18 anos. Formada em comunicação, conheceu a plataforma em 2019 para encontrar oportunidades onde o fato de ser uma mulher trans não fosse critério de exclusão.
“Antes da Transempregos, eu me candidatava em muitas vagas e não era chamada ou não ia adiante. Usando a plataforma, eu sabia que meu currículo seria olhado por empresas dispostas a acolher a diversidade”, afirma. Em outubro daquele ano, a partir de uma vaga anunciada na plataforma, conquistou um emprego na área de comunicação interna e marketing de uma empresa.
Já contratada, ela teve a oportunidade de ajudar a criar práticas corporativas para incentivar diversidade e inclusão, área em que se tornou especialista. Atualmente ela trabalha em outra empresa, em função semelhante.
“O mercado de trabalho está acordando para essa temática. A passos lentos, é verdade, mas estamos andando, e isso encoraja mais pessoas trans a buscarem oportunidades e pensarem numa carreira”, diz.
Isabella continua usando a Transempregos, mas agora está do outro lado, como contratante, ofertando vagas e buscando talentos pelo site. “É uma maneira de colocar outras pessoas trans em condição de empregabilidade”, afirma.
* Matéria de Fernando Barros, em colaboração para Tilt
** Legenda da foto principal: Isabella De Avila, 36, obteve emprego no Transempregos. Começou o seu processo de transição aos 18 anos.
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