#TBTPcDs: Pessoas com deficiência foram vítimas de genocídio dos nazistas
Adolf Hitler é considerado, pela maioria esmagadora do mundo democrático, o maior ou um dos maiores monstros já produzidos pela história. Sob seu comando, a Alemanha Nazista levou o mundo à Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que matou cerca de 70 milhões de pessoas e produziu destruições físicas e ambientais inimagináveis, e protagonizou um dos mais terríveis espetáculos de perseguição e dizimação de um pouco: o Holocausto, período em que cerca de seis milhões de judeus foram perseguidos, expulsos de suas casas e assassinados pelos alemães. O genocídio nazista contra os judeus foi parte de um conjunto mais amplo de atos de opressão e assassinatos em massa cometidos pelo governo nazista contra vários grupos étnicos, políticos e sociais na Europa. Entre as principais vítimas não judias do genocídio estão ciganos, poloneses, comunistas, homossexuais, prisioneiros de guerra soviéticos, Testemunhas de Jeová e deficientes físicos e mentais.
Hitler e seus correligionários do Partido Nazista eram obcecados pela criação da chamada raça pura ariana e, em busca dela, eliminavam todo e qualquer representante que pudesse, na visão deles, prejudicar este intento. Pessoas com deficiência eram encarados como seres defeituosos e onerosos ao Estado e, portanto, deviam ser eliminados. A sugestão de se fazer cumprir uma “higiene racial” foi um elemento essencial da ideologia de Hitler desde os seus primeiros dias. Em seu livro Mein Kampf (1924), ele escreveu: “Aquele que não é física e mentalmente são e merecedor não pode perpetuar este infortúnio nos corpos de seus filhos. O estado völkische [das pessoas] tem que executar aqui sua tarefa mais gigantesca. Um dia, porém, isso aparecerá como um feito maior do que as guerras mais vitoriosas da nossa presente era burguesa”. Em 1933, foi aprovada a Lei para a Prevenção de Descendentes Hereditariamente Doentes, prescrevendo esterilização compulsória para as pessoas com uma série de condições pensadas ser hereditárias, como a esquizofrenia, a epilepsia, doença de Huntington e “imbecilidade”. Entre 1933 e 1939, estima-se que cerca de 360 mil pessoas foram esterilizadas.
A esterilização de pessoas com deficiência também foi pensada, mas Joseph Goebbels, uma das figuras mais poderosas do Partido Nazista, tinha uma perna defeituosa e a ideia teve de ser tratada com muito cuidado. Entramos, então, no Aktion (Ação, em tradução livre) T4, programa de eugenismo e eutanásia da Alemanha Nazista, em que médicos alemães assassinaram milhares de crianças e adultos com deficiência durante a Segunda Guerra Mundial. Oficialmente, o programa existiu entre setembro de 1939 e agosto de 1941, mas continuou existindo, extraoficialmente, até o fim da guerra, em 1945. Durante a fase oficial da Aktion T4, 70.273 pessoas foram mortas, mas, no Julgamento de Nuremberg, encontraram evidências de que os médicos alemães e austríacos continuaram a eutanásia de doentes depois de outubro de 1941 e que cerca de 275 mil pessoas foram assassinadas sob a T4. Uma pesquisa mais recente, baseada em arquivos recuperados após 1990, dá um valor de pelo menos 200 mil pessoas com deficiência física ou intelectual mortas por medicação, fome ou nas câmaras de gás, entre 1939 e 1945.
O nome Aktion T4 se refere à Tiergartenstrasse 4, o endereço onde ficava localizada a sede da Gemeinnützige Stiftung für Heil- und Anstaltspflege, traduzido para o português como “Fundação de caridade para cuidados institucionais”. O órgão funcionava sob a direção do Reichsleiter Philipp Bouhler, e Karl Brandt, médico pessoal de Hitler. No dia 20 de fevereiro de 1939, nasceu na Alemanha o menino Gerhard Kretschmar, com várias deficiências. Seu pai, Richard Kretschmar, que o considerava um monstro, pediu ao médico do filho que o ajudasse a “colocá-lo para dormir”, mas o médico se recusou. Richard, então, escreveu uma carta para Adolf Hitler e solicitou que o Führer intervisse junto ao médico para acabar com a vida do pequeno Gerhard. Hitler acionou seu médico particular, Karl Brandt, para ir à casa dos Kretcschmar examinar a criança e decidir sobre a severidade da sua deficiência. No dia 25 de julho de 1939, aos cinco meses de vida, Gerhard Kretschmar se tornou o paciente zero do programa de eutanásia Aktion T4. Hitler aprovou e autorizou a criação do “Comitê do Reich para o Registro Científico de Doenças Hereditárias e Congênitas” (Reichsausschuss zur wissenschaftlichen Erfassung erb- und anlagebedingter schwerer Leiden), liderado por Karl Brandt, administrado por Herbert Linden, do Ministério do Interior, e Viktor Brack, SS-Oberführer. Brandt e Philipp Bouhler foram autorizados a aprovar candidaturas para matar crianças em circunstâncias semelhantes.
Em 18 de agosto de 1939, o Ministério do Interior do Reich fez circular um decreto exigindo que todos os médicos, profissionais de enfermagem e parteiras reportassem crianças recém-nascidas e com idade inferior a três anos que mostrassem sinais de severas deficiências mentais ou físicas. Autoridades de saúde pública encorajaram pais de filhos com deficiências a lhes enviar a várias clínicas pediátricas especialmente projetadas por toda a Alemanha e a Áustria. Essas clínicas eram ambulatórios de extermínio para crianças, em que funcionários de medicina recrutados assassinavam os jovens pacientes com doses letais de medicação ou por inanição. No início, os profissionais incluíam não só crianças e crianças pequenas na operação. Com o escopo da medida aumentando, incluíram também jovens de até 17 anos. Estimativas conservadoras sugerem que pelo menos 10.000 crianças alemãs com deficiências físicas e mentais morreram como resultado do programa de eutanásia para crianças durante os anos da guerra.
No dia 1o de setembro de 1939, Hitler assinou uma autorização secreta para proteger contra perseguição profissionais e funcionários de medicina, bem como administradores, sugerindo que o esforço se relacionava a medidas de tempos de guerra. Sob a liderança de Phillip Bouhler e Karl Brandt, operadores do T4 estabeleceram seis instalações de câmara de gás para adultos como parte da ação de eutanásia: Brandenburg, no Rio Havel próximo a Berlim; Grafeneck, sudoeste da Alemanha; Bernburg, na Saxônia; Sonnenstein, também na Saxônia; Hartheim, próximo a Linz no Danúbio, Áustria; e Hadamar, em Hessen. Os funcionários do T4 queimavam os corpos nos crematórios anexados às câmaras de gás e as cinzas das vítimas cremadas eram levadas de um monte comum para urnas a fim de enviá-las para os parentes. As famílias ou guardiões recebiam as urnas, junto a atestados de óbito e outras documentações, listando causas e datas da morte fictícias. Aos poucos, começaram a surgir focos de protestos públicos e privados contra os extermínios, especialmente dos membros do clero alemão, como o bispo de Münster, Clemens August Count von Galen, autor de um forte sermão, em 3 de agosto de 1941. Em face disso, Hitler ordenou a interrupção do programa de eutanásia aos fins de agosto de 1941 depois de ceifar a vida de mais de 70 mil pessoas com deficiência.
A ordem dada por Hitler, contudo, não significou o fim da Aktion T4. A eutanásia infantil permaneceu como antes. Em agosto de 1942, profissionais de medicina e trabalhadores da saúde alemães voltaram com os assassinatos, porém de forma muito mais velada. Mais descentralizada que a primeira fase de inalação de gás, o esforço renovado se calcava pesadamente em exigências regionais, com autoridades locais determinando o ritmo dos extermínios. Usando overdoses por drogas e injeções letais, a campanha de eutanásia retornou em inúmeras instituições por todo o Reich. Muitas das instituições também sistematicamente faziam vítimas adultas e crianças passarem fome. O programa de eutanásia continuou até os últimos dias da Segunda Guerra Mundial, se expandindo para incluir cada vez mais vítimas, como pacientes geriátricos, vítimas de bombas e trabalhadores forçados estrangeiros. Os historiadores estimam que o programa de eutanásia, em todas as suas fases, ceifou as vidas de 250.000 pessoas.
O programa de eutanásia representou em diversos aspectos um ensaio para as políticas genocidas subsequentes da Alemanha nazista. Os planejadores da Solução Final posteriormente usaram as câmaras de gás e crematórios, especificamente projetadas para a campanha do T4, para assassinar judeus na Europa ocupada pelos alemães. O pessoal do T4 que se mostrou confiável no primeiro programa de extermínio em massa ocupou cargos proeminentes nas equipes alemãs que cuidavam de centros de extermínio da Operação Reinhard em Bełżec, Sobibór, e Treblinka.
* Este texto foi concebido a partir de informações tiradas do site Enciclopédia do Holocausto (aqui) e dos canais do Youtube Vá e Veja: História e Literatura (aqui), Natália Fell (aqui), Canal History Brasil (aqui e aqui) e Victoria Schechter (aqui).
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