Candidatos à prefeitura cometem gafe ao falar de autismo

26/10/2024 Capacitismo, Deficiência Intelectual, Destaques, Notícias 0

Na última sexta-feira, 25, o Sistema Verdes Mares encerrou o período de campanha para a Prefeitura de Fortaleza com um debate entre os candidatos Evandro Leitão (PT) e André Fernandes (PL). Logo no início, o candidato petista se referiu ao Autismo como uma deficiência. De imediato, seu adversário reagiu e criou uma situação de “saia justa” para Evandro Leitão, que se desculpou e disse ter se corrigido pouco depois de falar. André Fernandes tentou capitalizar o momento, se dirigindo às “mãezinhas” dos autistas e apresentando algumas propostas para a área. Contudo, não é sobre isso que Sem Barreiras vai falar aqui, mas sim, do autismo e, no final, do termo “mãezinhas”.

Em primeiro lugar, é necessário destacar que autismo é sim uma deficiência. Em 2012, a então presidenta da República, Dilma Rousseff (PT), sancionou a Lei Berenice Piana, também conhecida como Lei No. 12.764/2012, que institui a Política Nacional dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Em seu parágrafo 2º, ela estabelece: “A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais”.

A pessoa autista, portanto, passa a gozar de todos os direitos estabelecidos em Lei às pessoas com deficiência. Assim, o candidato Evandro Leitão não errou ao se referir aos autistas como pessoas com deficiência e o candidato André Fernandes não tinha o direito de exigir retratação.

A polêmica do debate teve repercussão nas redes sociais entre militantes das pessoas com deficiência e da causa autista, especificamente. O advogado Emerson Damasceno, por exemplo, presidente da Comissão Especial de Defesa dos Direitos da Pessoa com Autismo da OAB Nacional, foi ao X, antigo Twitter, e publicou: “Autismo também é uma deficiência sim (…) A Lei Federal Berenice Piana, que tem mais de 10 anos, equiparou a pessoa autista à pessoa com deficiência. Uma conquista histórica”.

A jornalista Helaine Oliveira, mãe atípica do adolescente João, em seu perfil no Instagram, afirmou: “O Autismo é uma deficiência desde 2012 quando a então presidenta Dilma Rousseff sancionou a Lei Berenice Piana, que insere o autismo junto às demais deficiências, pois antes as pessoas diagnosticadas com TEA sequer tinham direitos previstos em Lei”.

Helaine complementa, dizendo que as pessoas autistas viviam em uma espécie de “limbo”, pois não eram “normais” nem consideradas com deficiência. Além disso, afirma que a utilização do termo “tratar” está correta, “pois não se trata apenas quem é doente (lembrando que Autismo não é doença), mas uma condição que precisa sim de tratamento, apoio, acolhimento e, sobretudo, inserção de forma plena na sociedade. Quanto mais gente informada, menos gente capacitista”.

Sem Barreiras destacou a última frase da jornalista porque ela explica grande parte da discussão no debate e da conduta do candidato André Fernandes. O uso permanente da causa autista e do termo “mãezinha” são dois exemplos do mais puro e nefasto capacitismo.

A grande verdade é que nem o candidato de Bolsonaro nem o candidato petista conhecem o assunto, profundamente. E será que eles sabem quem é Berenice Piana? O problema é que o tema deficiência gera votos. Assim, torna-se atrativo prometer projetos voltados a este público. Não aprofundam, não dizem de onde vai sair a verba nem como pretendem realizar a obra. Limitam-se a prometer, jogam números ao vento e criam o fato. Se, no futuro, o projeto não vir a luz do dia, paciência, eles já terão vencido a eleição.

O uso da palavra ‘mãezinha’ serve ao mesmo propósito. O candidato se aproxima das mães e cria um laço de intimidade e solidariedade. É a mesma prática em hospitais, com enfermeiros(as) e médicos(as) se dirigindo aos pais dos pacientes como “mãezinhas” e “paizinhos”, não importando se o paciente tem ou não deficiência ou qual sua faixa etária. São comportamentos constrangedores e indignos.

Lei Berenice Piana – Berenice Piana de Piana nasceu no município Dois Vizinhos, no Paraná, em 18 de agosto de 1958. É mãe de três filhos, sendo o caçula autista, o que lhe motivou a entrar na militância pela causa do TEA. Berenice idealizou a primeira clínica Escola do Autista do Brasil, implantada em Itaboraí, no Rio de Janeiro, em abril de 2014, além de participar da criação de leis em defesa do autista em vários municípios e estados brasileiros.

Seu ativismo lhe conferiu algumas honrarias, como o título de Embaixadora da Paz pela ONU e União Europeia e título de cidadã Anapolitana, em Anápolis (GO), em 2017. A Lei 12.764/2012, de iniciativa popular, ganhou força entre as associações de defesa dos autistas e homenageou a militante Berenice Piana.

Desde sua criação, recebeu algumas modificações com a criação de novas legislações, como a Lei Brasileira de Inclusão (Nº 13.146) e a Lei Romeo Mion (Nº 13.977). Dessa forma, trouxe um avanço significativo para as famílias de pessoas com autismo. Estas famílias enfrentavam dificuldades para garantir um tratamento adequado, inclusão educacional e suporte social para os filhos.

Além disso, impulsionou debates sobre inclusão social e ajudou a combater camadas de preconceito, promovendo uma sociedade mais justa e inclusiva para todos. O reconhecimento do autismo como uma deficiência legal garante que os autistas possam participar plenamente da sociedade, com as adaptações possíveis.

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