O Direito e a direita
Direito e direita. Duas palavras tão semelhantes, mas tão opostas entre si. Quando confrontadas, nos dão a exata ideia do estado em que se encontra o Brasil de hoje.
Na história brasileira, a direita (que alguns desavisados acreditam jamais haver existido em nosso país) sempre confrontou o Direito. Os interesses mais escusos motivam a direita a passar por cima dos direitos do povo, a subverter a democracia, a prender sem causa e a matar sem remorso, a jogar às favas os escrúpulos e se perpetuar no poder.
Vejamos: o golpe de 1964 foi obra da direita, que solapou o Direito, inclusive, ao habeas corpus; durante o regime militar, a direita baixava leis absurdas que retiravam do povo o direito de escolher seus representantes; não havia outro direito aos opositores da direita, a não ser ficar calado ou apanhar até a morte nos porões. Já o retorno da democracia, que poderia ser a alvorada do povo gerindo os destinos do Brasil, também ocorreu nos moldes da direita, que, mais uma vez, subvertendo o Direito, não deixou que o povo votasse para presidente, já em 1985, e, em uma manobra ainda não esclarecida, permitiu que José Sarney – membro histórico da direita – se efetivasse na Presidência da República, mesmo Tancredo Neves não tendo sequer chegado a tomar posse.
As eleições de 1989, por sua vez, foram manipuladas pela direita, em outra agressão ao Direito, com a manipulação de um debate eleitoral na Rede Globo (a mídia, por excelência, da direita), em prejuízo de Luís Inácio Lula da Silva, para a vitória de Fernando Collor de Mello, o mocinho bon vivant da direita. Mais adiante, em outra manobra ao arrepio do Direito, a direita comprou – literalmente – o parlamento para garantir a reeleição de Fernando Henrique Cardoso – que, de sociólogo de esquerda, virou prócer da direita mais conservadora.
Lula, para governar o país, após finalmente eleito em 2002, aliou-se com setores da direita – sempre ela, portanto, a dar as cartas, mesmo em governos de esquerda. Pagou o preço de tal aliança, mas, mesmo assim, conseguiu completar dois mandatos e fazer o governo mais popular da história do país. Veio Dilma Rousseff, com medidas econômicas típicas da direita, e sua reeleição, dentro dos ditames do bom Direito, que ocasionou sabotagem da direita – inclusive os setores que outrora se aliaram aos petistas – e nova subversão do Direito, o golpe de 2016, turbinado por passeatas de rua de movimentos fascistas de ultra-direita.
A ascensão de Temer trouxe de volta ao panteão do Planalto a mais reacionária direita, e esta, dia a dia, agride mais e mais o direito do povo brasileiro de ser feliz. A última agressão acontece no momento em que escrevo estas linhas, com a aprovação do regime de urgência de um projeto de reforma trabalhista puramente de direita, excelente para os empresários, trágica para os trabalhadores, legitimadora da escravidão e um traiçoeiro golpe no Direito trabalhista.
E assim, amigos e amigas, a direita brasileira ganha mais e mais espaço, com o auxílio de uma mídia sempre subserviente aos seus caprichos, em prejuízo do Direito. Aliás, ultimamente, até mesmo os representantes do Direito não o andam respeitando. Vide Sérgio Moro e seus arroubos autoritários, com direito a fotos e demonstrações de afeto a representantes da direita. Vide promotores de justiça como Cássio Conserino, José Carlos Blat, Fernando Henrique de Moraes e Deltan Dallagnol, com sua cruzada moralizante em defesa do Direito da direita e contra o direito de defesa de quem é de esquerda (especialmente se for petista). Vide ministros da Suprema Corte, como Gilmar Mendes, eminência parda da direita incrustada no meio dos operadores do Direito, mais preocupado em garantir seus próprios privilégios e salvar a pele de seus amigos do que em honrar a própria toga.
Perdão, há juízes verdadeiramente de Direito. Vide Maria Priscilla Veiga Olvieira, da 4ª Vara Criminal de São Paulo, que, corajosamente, rejeitou a tal denúncia do “triplex”, que afirmam ser do Lula. Argumento da ínclita juíza: denúncia por demais vaga. Claro, nada foi apontado que individualizasse a conduta ilícita de quem quer que tenha sido denunciado, apenas ilações sem qualquer nexo e claramente motivadas por interesse político de direita de quem deveria ser, apenas, operador do Direito.
Até acredito existirem pessoas de direita que prezam pela observância do Direito. Mas, pelo que se vê dos personagens de direita da política nacional, no Legislativo, no Executivo e no Judiciário, pelo que consta nos anais da história brasileira, o Direito e a direita nunca andaram de mãos dadas.
Assim continua. Até que o povo faça valer, de uma vez, seu direito de revolucionar e ser feliz de verdade no Brasil.
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