Foto de Victor Martinez, homem branco, com cabelos pretos, curtos e penteados para trás, barba escura e óculos de aros retangulares e pretos. Veste uma camisa rosa. Olha para a câmera, com um leve sorriso. Ao fundo, uma parede com quadros e fotografias.

“Precisamos incluir a deficiência nas pautas de diversidade”

01/01/2021 Notícias 0

O ano de 2020, definitivamente, ficará marcado pela perda das vidas em decorrência da pandemia do coronavírus, além das dificuldades econômicas e sociais trazidas pelas circunstâncias, especialmente por conta do desemprego. E se já não bastasse esse cenário, outro tema ganhou bastante repercussão na mídia neste ano: o preconceito e a falta de respeito à diversidade.

Após a morte de George Floyd no Estados Unidos, em 25 de maio, e mais recentemente, o assassinato de João Alberto Silveira Freitas em Porto Alegre, em 19 de novembro, véspera do Dia da Consciência Negra, o tema ganhou um significativo espaço na mídia e nas ruas, por meio de protestos ocorridos em todo o país. Grupos relativos à temática da diversidade passaram a ocupar as redes sociais e os lugares públicos. Movimentos em prol da igualdade racial trouxeram à tona a vulnerabilidade das pessoas negras e dos direitos que lhe são cerceados.

Outro tema que tem sido amplamente discutido é a igualdade de gêneros. Estudos do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram que 65% dos empregos perdidos entre março e setembro, período em que a pandemia afetou fortemente a sociedade, eram acupados por mulheres. Entre as pessoas que compõem o grupo LGBTQI+, dados de pesquisa divulgada em abril pela Universidade de Campinas (Unicamp), em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), revelam maior suscetibilidade à perda do emprego e problemas de saúde mental neste momento de pandemia.

Os povos indígenas estiveram e continuam em pauta em diversas mídias, devido à perda dos seus territórios, especialmente por queimadas e do alto risco de infecção pelo novo coronavírus, o que significaria um genocídio, segundo estudos da Secretária Especial de Saúde Indígena (Sesai).

Há, porém, outro grupo que também está entre as minorias, mas que, por muitas vezes, não é incluído na pauta da diversidade: as pessoas com deficiência. Isso ocorre porque, mesmo que seja de forma inconsciente, a sociedade brasileira ainda é muito imatura no que se refere à inclusão das pessoas com deficiência nos seus diferentes níveis e espaços. O entendimento de que a deficiência precisa ser incorporada à pauta da diversidade ainda não foi devidamente naturalizado. De forma em geral, ainda é entendido que os temas ligados às pessoas com deficiência devem estar apartados dos demais, precisando ser enfrentados apenas por um grupo de especialistas que se reúnem em uma “sala especial”. Entende-se a deficiência como uma doença que incapacita as pessoas, o que não é verdade.

Por diversas vezes, vimos a deficiência ser tratada por pessoas que não entendem o tema e não chamam para a discussão os protagonistas desse assunto, deixando para segundo plano o lema estabelecido na convenção da ONU de 2006, “Nada de nós sem nós”. Certamente, o debate e a indignação ligada à inclusão ainda estão muito fechados no universo das pessoas com deficiência, dos seus familiares e dos profissionais que atuam na área, sendo necessário integrar o seu discurso junto às demais minorias, popularizando a luta pela causa de forma ágil, democrática e efetiva.

Os dados trazidos pelo Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010 mostram que o Brasil tem mais de 46 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, sendo que grande parte vive em situação de vulnerabilidade social. Quando se fala em empregabilidade, dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2018 indicam que cerca de 430 mil pessoas com deficiência estão trabalhando, ou seja, menos de 1% dessas pessoas tem acesso ao mundo do trabalho.

Em relação à escolaridade, o direito à educação básica tem evoluído, no entanto, a maioria das pessoas com deficiência ainda não consegue ao menos concluir o ensino fundamental.

Ao olhar para um passado recente, a inclusão obteve muitos ganhos nos últimos 30 anos, em diferentes aspectos da sociedade, contudo, há muito o que se fazer nos campos prático e teórico, inclusive trazendo o tema para as discussões relativas às minorias, demonstrando que uma sociedade só é verdadeiramente inclusiva quando a pessoa mais vulnerável puder disfrutar de uma vida digna e autônoma. Do contrário, a palavra sociedade será apenas mais um termo distante do seu significado etimológico original, que seria associar-se ao outro, ser companheiro.

* Artigo de Victor Martinez, no Blog Vencer Limites, supervisor do serviço de Inclusão Profissional e Longevidade do Instituto Jô Clemente (aqui).

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