Apoio familiar é fundamental para o desenvolvimento

15/10/2011 Histórias de vida, Notícias 0
Bolas de borracha são divertidas e não oferecem perigo

Bolas de borracha são divertidas e não oferecem perigo

A psicóloga clínica e terapeuta de família, doutoranda em Psicologia Clínica pela PUC-Rio, Fernanda Travassos-Rodriguez, no site Portal Síndrome de Down, afirma que toda criança deve ser incluída na sociedade desde que nasce. “Ela precisa primeiro ser genuinamente inserida na sua família, senão fica muito difícil pensar em inclusão escolar e social”. Os pais, segundo ela, têm um preconceito que é anterior ao nascimento do filho e com freqüência não se dão conta disto até que alguém os aponte.  “Com este preconceito internalizado e, muitas vezes culpados por estes sentimentos, camuflam esta questão”, escreve Fernanda.

Para ela, o nascimento do bebê com Síndrome de Down consiste em um golpe narcísico para seus familiares, pois todo nascimento é sempre esperado com muita expectativa, visto que os sonhos ainda não realizados pelos membros da família freqüentemente são projetados para este bebê, antes mesmo da gravidez. “Quando qualquer criança nasce, os pais devem realizar um luto entre o bebê idealizado e o bebê real, aquele que chora, sente fome ou cólicas de sua maneira particular e, portanto, este período se caracteriza pela adaptação dos pais ao bebê”. No entanto, “quando o bebê nasce com a Síndrome de Down, acredito que os pais tenham uma ‘sobrecarga’ em termos elaborativos deste período de luto e adaptação”, disse.

A família entra em contato com um mundo novo e a reação a ele varia de membro a membro, de acordo com a história de vida de cada um e em função dos seus próprios (pré) conceitos acerca da Síndrome e da sua experiência em lidar com as diferenças. Quem também fala em preconceito na família é a psicopedagoga Marly Gurgel. “A mãe pode não ter a sorte de encontrar profissionais capazes e também pode não entender a situação e tratar o filho de modo pouco objetivo e, portanto, pouco produtivo”. Segundo ela, isso se daria por várias razões: “sensação de limitação, muitos tabus, auto-preconceito dos pais e ainda excesso de proteção”.

Daí, surge a importância do suporte psicológico à família, não apenas à criança. Fernanda Travassos explica que esse trabalho é raramente realizado em instituições e clínicas no Brasil. Marly diz que o apoio psicológico, normalmente, é para a criança e não para os pais, o que, em sua opinião, não é o método correto. Cláudia Pinheiro, fonoaudióloga, com especialização em Reorganização Neurofuncional Método Padovan (https://www.padovan.pro.br/), concorda com a inclusão dos pais no trabalho multidisciplinar, não apenas da criança. Segundo ela, “o papel dos pais é fundamental porque eles ficam a maior parte do tempo com as crianças, sendo importante orientar como dar o alimento da maneira correta, que tipos de alimentos são mais adequados e como falar com a criança”.

Brinquedos de madeira são usados com crianças com Down

Brinquedos de madeira são usados com crianças com Down

O trabalho multidisciplinar tem um papel fundamental no desenvolvimento da criança com Síndrome de Down, de acordo com a fonoaudióloga. “O trabalho multidisciplinar é importante. Cada profissional cuidando da sua área e ajudando os outros. A falta de um compromete o trabalho do outro”. Este trabalho deve começar ainda cedo. Segundo Marly, “a Síndrome de Down requer um tratamento precoce, ainda bebê, especialmente com fisioterapeuta para estimular o desenvolvimento motor e as sensações. Além disso, a criança tem muitas fragilidades, imunidade baixa e, com isso, mais facilidade de adoecer. É preciso que haja uma boa estimulação pulmonar e muscular”.

Quando o trabalho começa cedo, os pais aprendem que devem tratar seu filho como qualquer outra criança dita ‘normal’. O bebê com Síndrome de Down pode e deve ser inserido na sociedade desde bem pequeno, interagindo com outros bebês. Essa interação e ainda a ajuda da mídia com a publicação de livros e participação de atores com Síndrome de Down em novelas ou programas de auditório fizeram com que a criança se desenvolvesse bem mais nos últimos anos.

Cláudia Pinheiro afirma, pela sua experiência de consultório, que as crianças de hoje são muito espertas. “Elas levam mais tempo, mas o aprendizado existe”. Para ela, “não há muita diferença no trabalho entre uma criança com a Síndrome e outra sem. A única diferença é quanto ao tônus, a postura, a questão motora e sensorial. Mas, o trabalho em si, a técnica é a mesma”. Cláudia diz que a criança com Síndrome de Down é extremamente afetuosa, adora beijar e abraçar, o que contribui para o sucesso do trabalho.

Psicopedagoga há cerca de vinte anos, Marly Gurgel defende a educação inclusiva como sendo importante. “Crianças com ou sem deficiência em uma mesma escola é muito rico para ambas. Claro que existe o risco da discriminação, pois criança pode ser muito cruel, mas o ganho que se verifica com o relacionamento, as trocas de experiência e ainda o sentimento de partilha e colaboração, uma criança ajudando a outra, é enorme”. Marly afirma que, a partir de uma determinada época, a escola específica para uma criança com Down passa a ser necessária, pois “dá uma consciência maior à criança da sua realidade, dá o sentimento de pertença, pois ela está entre iguais”.

Marly lamenta não ter escolas em condições de receber essas crianças. Segundo ela, as escolas hoje não são estruturadas. Seu lamento é com o Governo, mas principalmente com os profissionais de educação. “Infelizmente, não é porque você é educador que será acolhedor. Você tem de combater a carga de preconceito que todos nós temos para realizar um bom trabalho. Não adianta você ser cheio de sabedoria e não saber aplicá-la”. A profissional afirma que a criança com Down é perfeitamente capaz de aprender, desde que receba atenção especial e acolhimento. Ela defende o uso de brinquedos específicos e direcionados para a criança com Down, como uma bola de borracha enorme, pois ela poderá pular em cima, empurrar, chutar, sem se machucar.

A questão social é outro fator importante na discussão. Marly conta que realiza um trabalho social em uma comunidade carente e se surpreendeu com a relação dos pais com seus filhos Down. Segundo ela, essas famílias não têm tantos tabus nem sentimento de proteção com as crianças, o que ajuda a equilibrar a balança no desenvolvimento do filho. Cláudia Pinheiro trabalhou, no início de carreira, no CDH (Centro de Desenvolvimento Humano) e, ainda na faculdade, no NAMI (Núcleo de Atenção Médica Integrada, da Unifor), tendo contato com famílias de baixa condição financeira, e afirma que classe social interfere no desenvolvimento da criança com Down, “não no trato familiar, mas na questão do Estado, pois elas não recebem a mesma atenção de saúde”. Ambas concordam que a criança precisa de calor, cheiro, vozes, do contato humano, manipular e ser manipulada.

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