Mães e filhos com deficiência dão exemplo de vida
“A minha segunda gravidez, na cadeira de rodas, foi melhor do que a primeira, quando eu ainda andava”. A declaração é de Leni Lima Ferreira, que sofre, desde os 15 anos de idade, da doença de Charcot-Marie-Tooth (leia mais no final). Leni conta que na primeira gravidez, de João Victor, que hoje tem 14 anos, apesar dela andar, não conseguia carregar o seu bebê quando nasceu por conta dos sintomas da doença da qual é portadora. Ela teve João Victor aos 23 anos. Já na segunda gravidez, aos 30 anos, de Samuel, que tem sete meses, e que ocorreu quando ela já era dependente da cadeira de rodas, Leni chegava a sair sempre com o bebê no colo, chegando até a pegar ônibus nestas condições.
Quando perguntada sobre as preocupações de uma mãe cadeirante, Leni é otimista: “eu não encontro dificuldade nenhuma. Tanto eu como meu marido somos cadeirantes e nossa casa é toda adaptada para nossa locomoção. Levo uma vida normal”. Leni diz que a doença não se impõe como limitadora da sua vida. “Isso vai muito da cabeça da gente, de como encarar o problema. Eu encaro de forma positiva”. Leni é cadeirante dançarina e também joga basquete em cadeira de rodas, assim como o marido Anderson Ferreira. (Leia mais).
Já a médica especialista em autismo Fátima Dourado vive o reverso desta situação. Ela é mãe de dois filhos autistas: Giordano Bruno, que tem 33 anos, e Pablo, com 30. Fátima é autora de dois livros sobre o autismo: Amigos da diferença: uma abordagem relacional da problemática do autismo e Autismo e cérebro social, compreensão e ação” (Leia mais).
Acerca do preconceito enfrentado por ter dois filhos autistas, Fátima afirma que há mais de 30 anos, quando Giordano Bruno, seu primeiro filho autista nasceu, o preconceito era fortíssimo. No entanto, ela assegura que ainda convive com pessoas preconceituosas. “O autismo é uma condição humana radicalmente diferente do que é considerado normal. O autista não compreende as noções e regras que regem a sociedade e, portanto, as viola, o que causa muito incômodo. É comum as pessoas pensarem que os autistas são apenas mal-educados ou que têm problemas emocionais. Mas, isso não é verdade. Os mais recentes estudos acadêmicos dão conta de que esta doença traz alterações neurológicas e funcionais e a criança apresenta dificuldade em decodificar os sinais sociais”, explica Fátima.
Ela tem outros quatro filhos sem deficiência e narra que eles também sofreram muito preconceito por causa dos irmãos com autismo. Tanto que o filho mais velho, Alexandre Dourado, é presidente da Abrace (Associação Brasileira de Ação por Direitos da Pessoa com Autismo). Para ajudar outras mães de filhos autistas e os próprios pacientes, Fátima fundou a Casa da Esperança, há 21 anos. Lá, trabalham 180 profissionais numa equipe de saúde multidisciplinar. A Casa da Esperança é a organização que tem maior número de pacientes atendidos em toda a América Latina.
Sobre as lições que a convivência com o autismo lhe ensinou, Fátima é categórica: “Conviver com o autismo para mim é aprender a não julgar os outros pela aparência e a ser mais generosa com meus próprios limites e os das outras pessoas”.
Doença de Charcot-Marie-Tooth – A doença de Charcot-Marie-Tooth (CMT), também conhecida como atrofia peronial muscular (APM), é um conjunto de neuropatias genéticas que afetam os nervos periféricos, podendo apresentar uma sintomatologia muito variada. Esquematicamente, a CMT atinge os nervos periféricos, que conectam a medula espinhal aos músculos, ocasionando uma perturbação na condução dos impulsos nervosos.
Embora relativamente rara, é um dos grupos mais comuns de neuropatias motoras e sensitivas hereditárias (NMSH); em sua forma hipertrófica, apresenta-se na infância (NMSHI). Nos nervos afetados, a condução de sinais fica comprometida, o que causa prejuízos na sensação (diminuição da sensação dos membros, em especial das pernas e pés), movimento, cognição e outras funções dependendo dos nervos envolvidos. A doença caracteriza-se por debilidade e atrofia muscular progressiva da panturrilha (atrofia muscular fibular), podendo ocasionar incapacidade progressiva, com déficits sensitivomotores e problemas ortopédicos (pé cavo). A doença não afeta a esperança de vida, não causa retardo mental e pode afetar homens ou mulheres. Em geral, a CMT evolui lentamente, mas também pode progredir em surtos.
A doença foi descrita pela primeira vez em 1884 por Friedrich Schultze (1848-1934), mas as descrições clássicas foram publicadas em 1886 por Jean-Martin Charcot e Pierre Marie, na França, e Howard Henry Tooth, em Londres. A doença de Charcot-Marie-Tooth não deve ser confundida com a doença de Charcot, também conhecida como esclerose lateral amiotrófica, que é muito mais grave.
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